segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

david grossman e "em carne viva"

David Grossman nasceu no dia 25 de Janeiro de 1954, em Jerusalém. Estudou filosofia e teatro, trabalhou como repórter e criador de programas na rádio nacional de Israel e é autor de uma vasta obra literária.
Grossman é um pacifista confesso e apoiou Israel durante o conflito com o Líbano, em 2006. No dia 10 de Agosto desse ano, ele e os seus camaradas de letras Amos Oz e A. B. Yehoshua participaram numa conferência de imprensa em que manifestaram ao Primeiro Ministro de Israel a urgência que se fazia sentir de um cessar-fogo que tornasse possível criar bases para uma solução para o conflito entre Israel e as forças do Hezbollah, no Líbano.
Dois dias mais tarde, o seu filho Uri, com 20 anos, foi morto no Líbano, numa operação militar.
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Numa entrevista a L'Express em 30/11/2000, que à luz deste acontecimento se poderia considerar premonitória se não fosse o facto de que com uma realidade como a que era vivida em Israel o estranho seria não se ser premonitório, David Grossman declarara que os israelitas alimentavam uma ‘cultura da morte’: “Os casais dizem ‘Vamos ter três filhos, se um morrer, ficamos ainda com dois’”. Mais adiante ele reconhece que é difícil fugir a essa memória da morte sempre tão presente. “O dilema dos pais reside nisto: devemos transmitir essa cultura aos nosso filhos? Estes não deixam de ter consciência óbvia da nossa angústia. Aquando da vaga de atentados suicidas de 1996, eu não mandava os meus dois filhos para a escola à mesma hora. Para não viajarem no mesmo autocarro. E isso continua a acontecer. Gostaria tanto de não ter de continuar a fazer este tipo de cálculo…”
?David Grossman falando em memória do Primeiro Ministro de Israel Yitzhak Rabin, na praça onde este foi morto, em Tel Aviv. 4 de Novembro de 2006.



Acabei há dois ou três dias de ler “Em Carne Viva” (2003), de David Grossman.
Segundo uma crítica da Los Angeles Times Book Review, “Em Carne Viva pode ser a mais estranha e triste história de amor alguma vez contada.”
E é verdade.
A história é simples. Yair vende livros raros. Um dia, numa reunião na escola, Yair vislumbra, muito de relance, uma mulher que lhe chama a atenção. Uma mulher discreta, sem nada que chame a atenção. Yair sente-se impelido a escrever-lhe uma carta arrebatada. É a primeira de uma troca de correspondência que os leva a uma intimidade muito mais profunda do que qualquer relação física. E no entanto ela apenas se realiza através de palavras.
Como é extraordinário o poder das palavras! Yair, a uma dada altura, conta a Miriam que pensara criar para o filho uma linguagem toda nova, feita de palavras cujos significados não estivessem contaminados, uma linguagem que lhe permitisse reinventar o discurso e criá-lo de novo, só com coisas boas.
O drama é que chega um dia o dia em que o que esperam de nós não é essa linguagem descontaminada e nova, mas uma linguagem que seja do uso de todos os outros e que quando esse dia chega é tarde demais para restituir às palavras o seu significado.
“Foram anos muito maus e eu insisti em escrever esta história sobre duas pessoas por sentir que a situação exterior era tão horrível e intrusiva, a invadir, a envenenar cada parte da nossa vida com medo e violência. Eu precisava de criar esta bolha de intimidade.” – declarou David Grossman em entrevista a Alexandra Lucas Coelho, no Público.
E é dentro de uma bolha de profunda intimidade feita de palavras que estas duas personagens – Yair e Miriam – vão desmontando as suas vidas reais, escalpelizando os sentimentos, dissecando os medos, autopsiando as esperanças mortas.
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Na tradução para inglês, o romance recebeu o título de “Be My Knife”, retirado de uma carta que Yair envia a Miriam: “Be a knife for me, and I, I swear, will be a knife for you.” A escolha do título em português, “Em Carne Viva” terá certamente sido alvo de grandes debates – interiores e exteriores – e, se não me parece uma escolha errada, ela não tem a profundidade de “Be My Knife”. Com efeito, só uma faca pode ir retirando, camada após camada, até atingir o mais íntimo de dois seres e depois de atingir esse íntimo mais íntimo, continuar a ferir, entrando onde se pensa não poder já chegar.
E é aí que chega David Grossman. Onde a faca penetra e não se contenta com a ferida que abriu. Para lá do suportável e do sofrimento das vidas feitas de uma argamassa estranha de caos e ordem que se sobrepõem continuamente e que vão encontrando palavras para definirem o impossível de definir. E quando alguém se esquece do significado das palavras, quando alguém “perde” as palavras, quando alguém deixa de se ligar com a realidade através do significado das palavras? Há dois caminhos, qual deles o mais terrível: não aceitar a a-normalidade e fingir para além da dor, ou restituir o significado às palavras nem que para tal seja necessária a mais dolorosa das mortes.
Bill Moyers, entrevistando David Grossman, Nova Iorque, aquando do lançamento do livro, afirma: “[em “Be My Knife” David Grossman] leva-me a um mundo diferente, um mundo onde eu nunca tinha estado”.
E não é um mundo agradável, apesar de “Em Carne Viva” ser uma bela história de amor, mas nem todas as belas histórias de amor são agradáveis. Ou poucas o serão.
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Uma curiosidade que David Grossman conta nessa entrevista a Bill Moyers é que quando a sua editora italiana, a Mondadori, andava à procura de uma fotografia para a capa de “Be My Knife” que pudesse ser, para Grossman, a Miriam do seu romance, encontraram num velho arquivo de família uma fotografia de uma jovem anónima. Quando o livro foi publicado em Itália, colocaram grandes cartazes nas livrarias. Um dia apareceu uma senhora de 84 anos que disse “Esta sou eu”. O nome dela é Molly Falk, é italiana e ficou muito satisfeita porque, segundo ela, “agora todo o mundo vai saber como eu era bonita”. Grossman acrescenta, dirigindo-se a Bill Moyers “Desculpe-me, mas tenho a certeza de que se fosse americana, nos tinha processado.”

sábado, 16 de fevereiro de 2008

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

ainda a preguiça e mais prazeres

? Kit banho de imersão

* Não é politicamente correcto nem sustentável, mas é um prazer.

** Já foi mais prazer, diga-se em abono da verdade.


domingo, 3 de fevereiro de 2008

preguiça e prazeres

© Andre Hugendobler, Paris 2007
e
Foi nesta época que ela chegou a minha casa. De linhas macias e curvas. Cromada e preta. Limpa, eficaz, discreta.
espaço

Já existia vida na terra antes de ela chegar. No entanto, não era exactamente a mesma coisa.

Já se bebia café antes de ele chegar. O ponto de ebulição da água já era a 96,8º C. No entanto, não era exactamente a mesma coisa.
Sim, Nespresso, what else? Esta, o segundo prazer, chegou no Natal. Já se bebia capuccino antes dela. O sistema solar já repetia os seus movimentos. As marés já dependiam da lua. Mas não era exactamente a mesma coisa.

Está frio. Está a chover. O dia esteve cinzento e melancólico. Na televisão está a dar um jogo de futebol. Vou fazer mais um capuccino. What else?

sábado, 2 de fevereiro de 2008

new york, new york

Lewis Hine, New York City, New York, 1930

O Empire State Building - inaugurado a 1 de Maio de 1931 - foi construído em menos de 15 meses, trabalhando na sua construção 3.000 homens. 14 operários morreram em acidentes. Foram utilizados dez milhões de tijolos. O edifício tem 6.500 janelas e 73 elevadores. As escadas entre o térreo e o último andar têm 1860 degraus. Recebe cerca de 2,5 milhões de visitantes por ano. Com a destruição do World Trade Center, no 11 de Setembro, o Empire State Building tornou-se novamente o edifício mais alto da cidade.
Na época em que foi construído, a procura era marcadamente inferior à oferta e só dez anos após a sua conclusão é que ficaram ocupados todos os espaços destinados a escritórios.